domingo, agosto 21, 2005

Relatos de uma rave

- Sabe uma coisa que nunca entendi direito? Essa de ficar usando óculos escuros em rave... sei lá, às 4 da manhã já não está escuro o bastante?
- Ih, isso é por causa da bala... quando você usa, suas pupilas dilatam, e com isso esse jogo de luzes pode agredir o olho se você não estiver de óculos...
- Ah bom... Então toda essa galera que está aí de óculos escuros está usando substâncias?
- É... ou às vezes está só tirando onda.
- Ah, na próxima rave na certa que vou levar meus óculos escuros, só para tirar onda de surtado também...

Ou melhor:

- Tá, me empresta o seu.

---------- Tunti-tunti-tunti-tunti ----------

As 5 etapas do surto economista:

1. Você pula. Luzes, pessoas como você pulando junto à sua volta, momento feliz!
2. Frio. O calor humano dos outros milhares de alucinados não é suficiente, você sente frio, muito frio. Cruza e se protege com os braços, só que a etapa 1 ainda não acabou, você também pula, pula sem parar. Pulos ininterruptos com os braços cruzados, quase uma nova coreografia.
3. Debate econômico. São 4 e meia da manhã de sábado e você passa a falar compulsivamente sobre regressões simples, múltiplas, contas nacionais, as 3 metodologias de cálculo do PIB. Em uma típica e calorosa discussão do economista da PUC com a economista da UFRJ, são discutidas as influências neoclássicas sobre o pensamento de Keynes... Para minutos mais tarde se darem conta de que, na verdade, os neoclássicos vieram décadas depois de Keynes.
4. Entrincamento. O corpo entrinca, os músculos se contraem, nervosismo, ai de quem estiver com os braços perto, potencial alvo de apertos e beliscões.
5. Arrependimento. Em uma etapa mais do que conhecida pelos bêbados, você senta, diz que nunca mais vai fazer isso novamente, tá, onde vende pirulito? (EEEEEIIIII, esse é igual ao que vendia no meu colégio!!!)

---------- Tunti-tunti-tunti-tunti ----------

Às 10 da manhã, seu amigo já sentado na grama, esperando os efeitos alucinógenos passarem, ao mesmo tempo em que discorre compenetradamente sobre os impactos antagônicos que balas e doces têm sobre o estado mental das pessoas (em um complexo discurso que já se arrastava há pelo menos 1 hora). Antes de ir embora, um último conselho:

- Tá, só uma coisa, se na volta para casa você começar a ver carneirinhos cruzando a Av. das Américas em frente ao seu carro, não acelera! Eles não são de verdade.

---------- Tunti-tunti-tunti-tunti ----------

Às 11 da manhã, tomando café da manhã na padaria em frente aos bombeiros. Na verdade um suco de laranja estritamente natural, sem adição de açúcar e conservantes. Pois não é porque você veio de uma rave que não vai se preocupar com a saúde. Logo depois de derramar acidentalmente metade da garrafa em cima da lixeira na qual estávamos comendo:

- Caramba, ele estava alucinadão mesmo.
- Não é para menos, misturar bala com LSD é dose...

E sendo veementemente repreendido pela minha interlocutora:

- Ssssshhhh! A gente está no meio de uma padaria, olha, tem uma criança comendo coxinha atrás de você! Não é para falar essas coisas por aqui, foi por isso que inventaram essas metáforas, use bala, doce!
- Ih... É verdade, isso que dá ficar misturando bala com doce, não pode fazer essas coisas, é para ficar mal a noite inteira mesmo, açúcar demais... E ainda vai ficar cheio de cárie depois.

Bahia, o mestre do despistamento!

---------- Tunti-tunti-tunti-tunti ----------

Meio-dia, chegando em casa, minha mãe lendo jornal no sofá da sala.

- E aí filho, cansado?

E como, mesmo sem dormir, a gente não pode dar razão à mãe:

- Claro que não, olha para mim, tô pronto para outra!

E para provar, ainda na porta, volto a dançar da mesma maneira que há algumas horas atrás, aquela típica coreografia que só faz sentido quando você está no gramado em meio a milhares de dopados ao som de música eletrônica.

- Tá Marcelo, a vizinha pode passar aí, fecha essa porta e vai dormir, vai.

1 Comments:

Blogger Roberto Iza Valdés said...

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8:48 AM  

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